segunda-feira, 5 de julho de 2010

Uma casa que é um barato

Carol Scolforo



Há nove anos, a artista plástica Isabelle Ribot, 48, fez as malas, na França, para cruzar o Atlântico, com os quatro filhos entrando na adolescência. Era um sonho antigo do marido, brasileiro, voltar ao país de origem com a família. Por fotos da internet mesmo escolheram a ampla casa 270 m², em uma rua tranquila do Jardim Paulista, em São Paulo.

Assim, encararam a aventura, trazendo da França os móveis da família – alguns herdados da mãe de Isabelle, originais dos anos 1950. Apenas isso e a ousadia do recomeço. “Não foi nada fácil. País, cultura, idioma e casa: era tudo muito diferente”, lembra a artista.

Ao lado, o quarto da artista: a cabeceira é uma de suas (belíssimas) telas. Melhor aproveitamento, impossível 

Mas a história ganhou contornos ainda mais inesperados. O casamento se desfez e uma parte da mobília foi embora, assim como o ex-marido, que voltou à França. “Trocamos de país”, ri Isabelle, da ironia do destino. Mas a parte feliz dessa fase é que as paredes do térreo da casa foram ao chão, integrando ateliê, sala e biblioteca da casa. “Ela ficou mais aberta. Precisava dessa liberdade”, diz a moradora, se lembrando da alegria que essa atitude trouxe. A decoração ganhou luminosidade e leveza – e era tudo o que Isabelle precisava.

O térreo é onde ela recebe os amigos, mas também é onde mergulha no trabalho. “Quanto mais produzo, mais surgem pinturas”, diz a densa “pintora”, como se descreve. Além da criação intensa, nesse espaço – que era a garagem da casa e virou sala, envidraçada - ela dá aula de artes para crianças.

No restante dos ambientes, tudo foi sendo reconstruído de forma única pela moradora, a partir da base neutra, branca, da casa. “É tudo uma combinação de acasos super visual”, ri. Por “acasos” entenda apostas corajosas e um olhar apurado: de vez em quando a artista encontra uma peça na rua, escanteada, e leva para casa. Ou então faz trocas de móveis com amigos. E assim, a decoração está sempre renovada. É como um hobby. “Vou misturando as coisas, e o conjunto vai ficando interessante”, diz, com um gerúndio de quem transforma a todo momento. Afinal, ela sabe que o tempo é um bom decorador, assim como o estilo francês, livre de regras prontas, mas muito envolvido com a moradia. “Nosso jeito de decorar não se prende à moda”, explica. A casa parece devolver a resposta. “Ela me dá essa sensação de liberdade, de segurança”.

Cheio de misturas inusitadas, o visual deixa exposta a lição aprendida na mudança, como a própria história de Isabelle. “Se fosse me mudar outra vez, não levaria muito. Meus móveis (poucos, de verdade), meus tecidos e as telas são o eixo da minha casa. O resto vai se montando de acordo com o lugar”, conta. É assim que ela dá um tom único a seu jeito de morar: nada ali custou caro, embora tenha incalculável valor afetivo. “Procuro não gastar dinheiro com decoração. Decorar dessa forma é um desafio permanente e gostoso para mim”.

Publicado na edição de junho de 2010, na Revista Casa e Jardim, ed. Globo.

quarta-feira, 6 de janeiro de 2010

Muitas maneiras de amar sua casa e sua vida

Carol Scolforo

1 - Pense nos seus hábitos, em seus hobbies e em tudo o que causa bem-estar em você antes de decorar sua casa.Dê espaço ao que realmente tem valor em sua vida. Esqueça as soluções prontas importadas: antes de adotar uma cozinha americana, perceba se ela segue o seu estilo de vida.

2 - Resgate as memórias de família – sem transformar sua casa em um museu, claro. A casa precisa contar sua história com objetos de viagem, fotos e livros. Exponha as boas crônicas da sua vida.

3 - Se você mora em um espaço pequeno, invista em um ambiente com menos móveis. Muita informação visual sobrecarrega o cérebro humano e não o deixa descansar. A sensação de amplitude é necessária ao relaxamento, segundo pesquisas.

4 - Natureza é essencial ao bem-estar. Plantas, fontes, pedras emadeira nos remetem a origens. Inconscientemente, sentimos estabilidade. A explicação é antropológica: a floresta representa um lugar confiável à espécie humana.
5 - Aromas, sons, texturas e simplicidade são bem-vindos, pois se tornam atraentes aos nossos sentidos. Além disso, estimulam a permanência e fazem os visitantes se sentirem bem. Casa sem esses elementos corre o risco de ser um lugar estático, sem vida.
6 - Não siga a moda das vitrines de loja. Quanto mais consciente você estiver de quem é, mais o seu espaço terá personalidade. A casa serve para nos lembrarmos de quem somos, diz o filósofo Alain de Botton, em seu livro A arquitetura da felicidade.
7 - Renove sua moradia sempre, para mantê-la viva e adequada a sua rotina. Pesquisas das Universidades de Bergen (na Noruega) e de Gutemburgo (na Suécia) apontam que a capacidade de fazer mudanças estruturais em um imóvel é essencial para se sentir realmente dono da casa. Isso ajuda a criar um elo emocional como espaço.
8 - Sua casa precisa ser (bem) diferente do local de trabalho, senão, possibilita pouco descanso. Lâmpadas precisam seguir tanto um design diferente quanto ter faixas de luz amareladas, que relaxam a mente. Até mesmoo home office deve ter essa autenticidade.
9 - Deixe a luz natural entrar. Se onde você mora é impossível seguir essa dica, pelo menos tenha lâmpadas que sigam (ou simulem) a luminosidade do dia. A luz interfere diretamente no bom humor dos habitantes.
10 - Reaproveite o que puder na decoração. Exercite a criatividade e repagine a casa gastando pouco. Garimpe em brechós e perca tempo renovando e descobrindo novas peças.

Fontes: psicóloga Angelita Scárdua Viana, arquiteta Kelly Guariento Marques, arquiteta Maria Elvira Rofete, designer de interiores Maristela Gorayeb e livro A arquitetura da felicidade, de Alain de Botton (Ed. Rocco)

publicado em agosto/2009 na revista Casa e Jardim

Cinco motivos para adotar um animal

Carol Scolforo

1. Não apenas cães e gatos provocam sensações positivas. Observar um peixe em um aquário pode ter efeitos semelhantes aos da hipnose, reduzindo a ansiedade em pacientes à espera de uma cirurgia, por exemplo. E melhor: aquários são obras vivas de decoração.

2. Tanto para adultos quanto para crianças, interagir com animais diminui a pressão arterial. “Essa relação acalma e também mobiliza a sair da inércia”, diz a psicóloga Denise Gimenez Ramos. Um estudo publicado no British Journal da Royal Society of Medicine sustenta que quem tem um bicho em casa reclama menos de pequenos problemas de saúde, por isso, é mais feliz.

3. Animais em geral também são bons aliados de adultos e crianças mais inibidos. “Para idosos, podem até ajudá-los a sair da depressão”, afirma Denise Gimenez Ramos. Com o peso desse argumento, recentemente, nos Estados Unidos, cães passaram a ser adotados em visitas hospitalares, com resultados visíveis na recuperação de pacientes.
4. Para a ciência, animais se integram tão facilmente em nossa vida porque possuem estruturas anatômicas idênticas às nossas. “Eles têm sensações, são inteligentes, têm memória e uma profunda sensibilidade de convívio com outras espécies e como ser humano”, analisa a médica veterinária Irvênia Prada.

5. Uma tese um pouco mais audaciosa sustenta até uma certa telepatia entre homens e animais. “O biólogo inglês Rupert Sheldrake, autor de Cães sabem quando seus donos estão chegando, diz que os cachorros se comunicam telepaticamente com os cuidadores humanos”, cita Irvênia Prada. Basta olhar fundo nos olhos deles para sentir essa interação mágica.

Publicado na revista Casa e Jardim, edição de novembro/2009

A alma dos objetos

Uma decoração com peças escolhidas segundo o gosto do dono, que sejam realmente usadas e tenham algo a dizer, traz magnetismo, transmite boa impressão e convida a ser desfrutada

Carol Scolforo

O resultado final da decoração não é o mesmo sem uma escolha benfeita de objetos. Pinçar uma peça de personalidade, que realmente faça sentido em um determinado ambiente ou cantinho, pode encher a casa de afeto e de vida, e assim transmitir um clima bom a quem entra ali, convidando a um interesse mais profundo. É uma relação inconsciente, que deixa claro que objetos têm alma, são dotados de emoções.

Parece um papo estranho, mas essa realidade é nítida no filme francês Horas de verão (L´heure d´été, 2008), do diretor Olivier Assayas, cujo elenco traz Juliette Binoche e Jérémie Renier. A história de uma família é contada, com suavidade, a partir do espólio que três irmãos receberão após a morte da mãe. Quando um deles se desapega de alguns raros vasos de cristal e doa um deles a um museu, percebe que, para muitos visitantes da instituição, aquela peça não faz sentido algum. Já enquanto pertencia à família, o vaso fez parte de capítulos importantes de sua vida.

Há uma explicação interessante por trás desse valor afetivo. “Criamos nosso cosmos. Damos significado às coisas e elas ganham simbologia. Por isso, é natural adotarmos objetos que nos façam sentido”, observa o filósofo Mário Sérgio Cortella. E você estava achando que o criado-mudo não dizia nada na decoração...
A questão vai muito além de simples apego. Objetos são uma extensão das ações humanas. Além de funcionais, eles também nos lembram quem somos. “As pessoas gostam de se ver no que expõem”, observa Cortella. É assim que se cria um espaço autêntico, irresistível – como deve ser a casa. “Somos uma subjetividade que precisa se objetivar”, completa. Ao mesmo tempo, acumular objetos sem real importância pode trazer desequilíbrio para a moradia. “Memórias são úteis. No entanto, desapegar-se do inútil, do que não faz mais sentido, é preciso.”

Cena do filme Horas de verão, de Olivier AssayasÉ claro que a casa precisa ter espaço para o novo. Ultimamente, do outro lado da vitrine há um design mais preocupado com essa química de sensações inéditas. “A emoção responde a um estímulo externo por meio de cor, forma, aroma, textura. Assim, podemos desenvolver produtos que intencionalmente provoquem um estado de ânimo”, diz a designer portuguesa Susana Paixão Barradas, que pesquisa o tema na Espanha. Outra preocupação moderna do design é melhorar relações sociais e interligar pessoas a ambientes. “O desenho de um objeto pode conectar pessoas, aproximá-las”, diz Donald Norman, no livro Emotional design – why we love (or hate) everyday things.

Por essas e outras, um design inovador pode, sim, custar caro. No entanto, como uma pesquisa da Universidade de Chicago já comprovou, os objetos mais preciosos que as pessoas guardam não têm custo alto. Pelo contrário. Fotografias ou objetos feitos à mão, se expostos, dão valor extra à decoração. Com criatividade, você pode tirar partido desses elementos e encher a casa de magnetismo.

sábado, 5 de setembro de 2009

A moda é ser feliz

Alcançar o bem-estar em casa envolve perceber valores que ultrapassam tendências de decoração. É disso que trata o seminário lançado por Casa e Jardim, que vai debater as transformações pelas quais passam um lar e a liberdade de decorá-lo com humor, histórias de família e, sobretudo, estilo próprio

Texto Carol Scolforo. Repórteres de imagem Ana Claudia Marques e Denise Costa. Fotos Rogério Voltan

Se a casa tem papel fundamental na alegria de viver, qual é o sentido de buscar na vitrine da loja o pacote completo do contentamento? Mais sensato é recorrer à alma do lar, e de quem vive nele, para decorá-lo com legitimidade. Em A felicidade mora aqui, seminário que Casa e Jardim realiza no dia 30 de setembro, no hotel Grand Hyatt, em São Paulo, convidados nacionais e internacionais se reúnem em torno dos temas A casa em transformação e Decorar com liberdade. O evento é voltado para arquitetos, decoradores, designers e paisagistas.

Às vezes teimamos em levar para casa o sonho que se vende na loja – seja o móvel, o objeto decorativo, a cor da parede, a TV para lá de moderna ou um determinado piso. No entanto, devidamente instaladas, as aquisições podem não fazer sentido nenhum. A sensação é estranha, de que algo não vai bem. Inconscientemente, nos sentimos mal em um lugar que deveria nos atrair e revigorar nosso humor. Pois é. Adotar o que está na moda simplesmente porque é moda ou a tendência do momento sem que caia bem ao seu estilo é quase atropelar a personalidade dos moradores. Por fim, nos sentimos mais em casa fora dela do que entre suas paredes.

Mais do que local de abrigo e proteção, a casa é nossa terceira pele, nossa esfera de reconhecimento. Como diz o filósofo suíço-britânico Alain de Botton, em seu livro A arquiteturada felicidade, “um lar é um espaço que consegue tornar consistentemente disponíveis para nós as verdades importantes que o mundo amplo ignora, ou que nosso eu distraído tem dificuldade em manter”. Botton é um dos estudiosos que buscam mudar o foco do assunto para o indivíduo, sem deixar de lado a estética ou a funcionalidade. Ele está interessado em mostrar os valores, sonhos e memórias que dificilmente estão impressos nos catálogos de decoração. “Um lar é um espaço que consegue tornar consistentemente disponíveis para nós as verdades importantes que o mundo amplo ignora, ou que nosso eu distraído tem dificuldade em manter” Alain de Botton, em A arquitetura da felicidade Ninguém está ofendendo nenhuma tendência, é claro.

Afinal, a maioria delas sai de estudos importantes para facilitar a rotina, levando em conta o estilo de vida de cada um. Mas fazer uma triagem que tenha a ver comas próprias verdades é essencial para morar bem. Quer um exemplo? Quando se espalhou pelo mundo a ideia americana demorar em loft, muita gente adotou esse estilo de vida. No entanto, a derrubada de paredes se choca como desejo de privacidade. “Os moradores de uma casa têm necessidades diferentes e se refugiam em cantos distintos. A privacidade garante que cada um expresse seu desejo”, diz a psicóloga capixaba Angelita Corrêa Scárdua, mestre em psicologia social e especialista em neurociências e comportamento. Mesmo que haja na casa um morador único, a banalização visual dos ambientes pode se tornar um fator estressante, cansativo.

Falta de funcionalidade é outro aspecto que irrita. “A estética precisa ser funcional”, frisa Angelita, citando cubas de lavabo muito rasas, outra tendência amplamente utilizada nos últimos tempos. “Algumas aplicações ficam só de enfeite, as pessoas acabam deixando-as de lado. E gera estresse um investimento inutilizado. ” Também irrita e incomoda ver reparos por fazer, segundo Alain de de Botton: a falta de iniciativa se escancara.

A mesma sensação estática se aplica a uma casa que pouco se renova, que tem uma decoração definitiva. “É preciso criar espaço para o novo entrar e estimular o cérebro. Um lugar onde nada muda há anos sinaliza uma espécie de inércia emocional”, aponta Angelita Scárdua. Ao mesmo tempo, incluir muita tecnologia no espaço doméstico também pode estagnar a atividade dos moradores.

Equipamentos eletrônicos em excesso no quarto, por exemplo, interferem na energia entre essas quatro paredes. “Claro que as tecnologias são necessárias, mas pelo menos o quarto, que é um lugar de descanso, deve evitar concentrá-las”, detalha a bioarquiteta capixaba Kelly Guariento Marques. “A casa é o lugar onde se abrigam vontades, desejos, sonhos. Por isso não pode ser um produto descartável” Maria Elvira Rofete, arquiteta Facilidades como essas tornam mais fácil a correria da rotina. No entanto, escanteiam a profundidade de uma moradia. “As pessoas acabam passando pela casa. Vivem correndo e deixam de lado os sentidos, a percepção desse lugar. Por isso adotam a moda. Falta profundidade em morar, falta alma nos ambientes”, observa a designer de interiores paulistana Maristela Gorayeb.

Essa história ainda pode ser revertida, se forem privilegiados aspectos emocionais como memórias de família, boas histórias, aromas, sons, texturas e suavidade visual (simplicidade, não monotonia). Assim, a casa se torna verdadeiramente revigorante. Afinal de contas, a moda é o que queremos que os outros percebam, como diz a arquiteta, urbanista e professora do Centro Universitário Belas Artes de São Paulo, Maria Elvira Rofete. “Já o estilo, dentro de casa, é o que somos. E não o sonho que se vende na loja ou na mostra de decoração.”


publicado em http://revistacasaejardim.globo.com/Revista/Common/0,,EMI90390-16940,00-A+MODA+E+SER+FELIZ.html

Setembro de 2009 na revista Casa e Jardim, ed. Globo

sexta-feira, 14 de agosto de 2009

Por um namoro sem território

Carol Scolforo

(matéria publicada em A Gazeta, em 07/06/2009)

Ninguém estranha ver pares de namorados se beijando, andando de mãos dadas ou escancarando chamegos no shopping, no aeroporto, no restaurante. Mas se ambos forem do mesmo sexo, o mundo para pra ver.E aí entra aquela velha questão, que muitos preferem nem trazer à tona: por que os casais homossexuais não têm o direito de namorar como os hétero? Por que ainda enfrentam olhares e até mesmo xingamentos quando caminham de mãos dadas, se abraçam ou se beijam em público?

Afinal, temos todos os mesmos direitos? Ou não?O advogado e professor de direito constitucional da FDV (Faculdade de Direito de Vitória) Kaleb Salomão garante que som. “A constituição brasileira assegura a liberdade de expressão, mas a sociedade brasileira não está moralmente preparada para ver um beijo homossexual”, observa ao mesmo tempo que garante: “Apesar disso, uma cena de namoro gay não pode ser considerada um ato obsceno na visão do direito. O direito não interfere em uma expressão de carinho entre pessoas do mesmo sexo”.

O direito assegura, mas em função do preconceito, a maioria dos casais opta por não beijar. Mas há quem não concorde com isso. “Como militante do movimento de lésbicas no Estado, eu beijo mesmo mina namorada. Para garantir meu espaço”, diz a mestre em educação Ariane Meireles, 43, á 6 meses apaixonada por Rosa Posa, também de 43 anos.

Ariane não mede carinho. Beija no aeroporto, anda de mãos dadas em todo e qualquer lugar, deita no ombro de Rosa no barzinho, como héreros fazem por aí, sem receber olhares maldosos. “Quando andamos de mãos dadas no aeroporto, as pessoas ficam imobilizadas. Olham. Olham. E olham de novo”, conta Ariane, que hoje, dá de ombros a esse comportamento. Já Rosa é diferente. Prefere medir os carinhos porque acredita que as pessoas podem encarar como uma afronta. Ariane continua descordando.

Casais homossexuais contam como se comportam em lugares públicosAcha que o casal gay não pode deixar de fazer aquilo que tem vontade – dentro dos limites, é claro – assim como fazem os héteros.“As pessoas têm medo de sair comigo pra barzinhos. A dona de um bar já pediu para pararmos de nos beijar, em Itaparica, porque os clientes estavam incomodados. Como minha namorada pediu pra não arranjarmos confusão, fiquei quieta”.

Ariane reconhece que seu comportamento é uma exceção,e vai além do medo que os homossexuais têm de demonstrar afeto no meio da multidão de olhares. Exatamente por isso ela ousa. “Já aconteceu de algumas pessoas não entrarem no banheiro comigo por saberem que sou lésbica”. Lembra, indignada.Apesar de fazer o que quer, gostaria de não ter que enfrentar olhares preconceituosos ou comentários de mau gosto. “Nós, homossexuais, não temos um espaço de liberdade. O que acontece muito são homossexuais promoverem suas festas particulares, onde todos podem se divertir sem medo porque se veem com igualdade, sem julgamentos”,observa.

Para ela, essas festas resolvem parte do problema, mas aceitar esse confinamento é uma alternativa ao desrespeito social, o que não contribui para abrir a cabeça das pessoas.

Diversão fica restrita à casa de amigos

Somente uma minoria escancara a relação. A maioria sai por aí como amigos, com mãos desgrudadas e olhares desviados, numa tentativa de esconder qualquer química afetiva. Assim, segundo eles mesmos, os pensamentos maldosos dos passantes ficam menos evidentes.“Andar de mãos dadas é um direito conquistado. O casal gay pode andar assim em shoppings, praias ou qualquer luar público. Mas não é nossa opção. Cada um age conforme sua consciência”, diz Jorge Castro, que á duas semanas se mudou para São Paulo com o namorado, Tiago Nunes Diniz.

“Podemos nos beijar no shopping? Sim”. Se não pensarmos que ali grande parte das pessoas são hétero e que seria um escândalo para elas. Se as pessoas aprendessem desde cedo que é natural um homem beijar outro homem, assim como é natural um homem beijar uma mulher, com certeza faríamos isso e não haveria escândalo”, diz Jorge.Até porque ele sabe que o preconceito, muitas vezes, vem em forma de socos e pontapés. Por isso, faz questão de ser discreto.” O desgaste público seria deselegante. Com o tempo, esse respeito virá”, acreditam. Assim, a diversão, para o casal, acaba tendo limites definidos.“Vamos a boates gays, ao quiosque Luí, na Praia de Camburi, ou, à casa de amigos mesmo. Lá, não somos julgados e não recebemos olhares de reprovação”.

Por algum tempo, Jorge e o namorado foram promoters da boate gay Move, o que facilitou ter mais contatos para se divertirem, como qualquer casal. Mas eles ressaltam que as opções de lazer ainda são poucas. Em Vitória, há uma boate e um quiosque e em Vila Velha, duas boates e três bares.Em locais com o rótulo GLBT, ninguém precisa se preocupara. Já na fila do cinema capixaba, por exemplo qualquer afeto é registrado, o que, segundo eles, não acontece em São Paulo, onde vivem. “Vitória é uma cidade linda, tem clima gostoso, é o melhor lugar para se viver. Mas é uma cidade pequena. As pessoas ainda são muito fechadas. São Paulo é diferente. Tudo é mais natural”, avaliam.

Não é à toa que lá eles se permitem dar as mãos no metrô ou na fila do cinema. Isso sem contar com a variedade de opções de serviços e lazer para os gays. Casas noturnas, lojas, salões de beleza, restaurantes e pubs específicos para o público GLBT se multiplicam na Terra da Garoa. “Não por acaso, a maior parada do orgulho GLBT acontece aqui”, diz Thiago.Homossexuais contam como se comportam em lugares públicosAcha que o casal gay não pode deixar de fazer aquilo que tem vontade – dentro dos limites, é claro – assim como fazem os héteros.“As pessoas têm medo de sair comigo para barzinhos. A dona de um bar já pediu para pararmos de nos beijar, em Itaparica, porque os clientes estavam incomodados. Como minha namorada pediu pra não arranjarmos confusão, fiquei quieta”.

Ariane reconhece que seu comportamento é uma exceção, e vai além do medo que os homossexuais têm de mostrar afeto no meio da multidão de olhares. Exatamente por isso, ela ousa. “Já aconteceu de algumas pessoas não entrarem no banheiro comigo por saberem que sou lésbica”, lembra, indignada.Apesar de fazer o que quer, gostaria de não ter que enfrentar olhares preconceituosos ou comentários de mau gosto. “Nós, homossexuais, não temos um espaço de liberdade. O que acontece muito são homossexuais promoverem suas festas particulares, onde todos podem se divertir sem medo porque se vêem com igualdade, sem julgamentos”, observa.

Para ela, essas festas resolvem parte do problema, mas aceitar esse confinamento é uma alternativa ao desrespeito social, o que não contribui para abrir a cabeça das pessoas.

terça-feira, 11 de agosto de 2009

A liberdade na ponta do lápis

O simples rabiscar em uma folha de papel ajuda na concentração, espanta fobias e ajuda até na hora de estudar

Carol Scolforo

Bastam alguns traços para criar uma casa, duas curvas para formar o símbolo do amor, alguns pauzinhos para botar qualquer ser humano no papel. Ou no muro. Ou no chão. Desenhar nos dá liberdade para irmos para onde bem entendermos. Às vezes, um desenho é capaz de nos transportar até para um passado remoto. Afinal, foram os traços feitos nas paredes das cavernas que transmitiram a nós, homo sapiens, o modo de vida daquela época. Um instinto que ainda hoje toma conta de todos – principalmente na infância.

Que criança não adora fazer sua arte nas paredes de casa? Geralmente, mamães e papais nem gostam tanto, mas os rabiscos coloridos, com certeza, traduzem a realidade dos pimpolhos. Depois dessa fase, aprendemos que desenhando letras passamos mensagens. Mas há ainda quem diga que uma imagem vale mais que mil palavras.

O bom de tudo isso é que os resultados dos traços no papel podem surpreender e, de quebra, melhorar a vida de muita gente. Aliás, rabiscar é tão terapêutico que a francesa Claire Fäy lançou o caderno de atividades com vários passatempos para adultos. Em vez de fazer intrigas no escritório, Claire sugere descontar no caderno o tédio, as ansiedades e frustrações. “É uma válvula de escape para funcionários indignados”, diz ela. Sucesso Sem efeitos colaterais ou contra-indicações do pessoal do RH, o livrinho é sucesso em vários países europeus – permaneceu um ano nas listas de best-sellers franceses, garantiu sua posição entre os dez livros mais vendidos naquele país em 2007, e foi traduzido em dez línguas.

Para gente um pouco menos estressada – como as crianças –, desenhar envolve criatividade, como resumiu, no século passado, o professor de artes Viktor Lowenfeld. “ É por meio da atividade criadora que a criança desenvolve sua própria liberdade e iniciativa, e reconhece as diferenças individuais”, disse ele, cheio de experiências no campo.

Já o pesquisador Georges-Henri Luquet diz que o ato de desenhar força a criança a observar o mundo que a rodeia. “ Isso a obriga a vasculhar dentro de si modelos, modificando-os na medida em que evolui sua concepção de desenho”. Tudo bem, desenhar não é algo tão racional, ou medido em benefícios. Mas se essas razões não forem suficientes, há ainda a do escritor italiano Domenico de Masi: torne seu ócio realmente mais criativo. Entendeu, ou quer que eu desenhe?

Hobby virou emprego

Ter olhos abertos para a singularidade da vida é algo que mora nas entrelinhas de um caderno de desenhos. E sensibilidade se exercita até sem ver as cores - como Gabriel Medeiros, um cara com sorriso de covinha, faz desde pequeno. Descobriu o daltonismo pequeno, mas sempre pediu lápis de cor de presente. “Nunca tive carrinho, quando era criança. Gostava de desenhar, mesmo, e ganhava lápis e cadernos até no Natal”, ri.

Das cores da caixinha, amarelo é sua preferida, já que é a única que distingue bem. Mas em preto e branco, ou com tons psicodélicos, ele leva seu caderno para todos os momentos. Já desenhou no carro, na feira, na fila do banco e na inspiradora Pedra da Cebola.

Uma vez, passou um dia inteiro debruçado no papel. E como todo estudante que gosta de desenhar, já teve cadernos apreendidos em diversas aulas. Aprendeu, é claro, a lição. “Desenho só nos intervalos das aulas”, diz ele, com um sorriso de apaixonado por lápis e papel. Entrou para a faculdade de moda por gostar de desenhar estampas, mas quando se viu pressionado por criações que saíssem do papel, travou. E resolveu mudar de curso, três meses depois: preferiu ser fotógrafo. Hoje, ele desenha sobre as fotos que faz, e com isso, o hobby rendeu grana extra. Já fez folder, agenda e capa de jornal institucional. “Comecei a estilizar meu traço quando mudei de curso, e aí encontrei meu trabalho como queria”, comenta. E como nutrir a inspiração para dar química ao lápis e papel?

Para Gabrel, como o moço atende mais bem-humorado, a inspiração vem dos toy arts, da música instrumental, do stop motion (técnica que põe movimento em desenhos) e do adorado Tim Burton (o diretor dos fantasmagóricos “Edward Mãos de Tesoura” e “Noiva Cadáver”). O resultado são os traços únicos e poéticos de um estudante de 22 anos, que já ganharam quase 4 mil visualizações no YouTube. Quer uma pontinha? Acesse aí: www.flickr.com/mundobrel; www.mundobrel.blogspot.com ; www.youtube.com/gaabrel.

Para adultos:

Não sabe nem por onde começar? Solte o lápis, sem obrigações estéticas. O importante é criar algo novo, sem se prender a críticas ou esperar elogios.

Desenhe para você, para descobrir de verdade quais são suas cores. Está com raiva, medo, frustrado? Desconte no caderno o tédio, as ansiedades e frustrações. O desenho pode dar forma a suas emoções.

O assunto da próxima reunião é desinteressante? Aqueles desenhos aleatórios que saem do papel enquanto ouvimos, ao contrário do muitos pensam, ajudam a nos concentrar. E se o objetivo for se concentrar ainda mais, desenhe mandalas. Quem garante é a psicóloga Monalisa Dibo que estuda o assunto há anos.

Para crianças: Dê a seu filho canetas, papéis, tintas, de acordo com a idade dele. Não é recomendável livros de colorir, pois as figuras e objetos delimitados restringem a criatividade. Dê a ele um avental de plástico e cubra as áreas próximas. Isso o deixará menos inibido e receoso de fazer bagunça - além de deixar a mamãe feliz com a limpeza.

Ensine seu filho a ser cuidadoso e responsável com o trabalho. Dê uma opinião honesta, significativa e construtiva sobre a qualidade do trabalho. Transmita a ideia de que os trabalhos do seu filho têm valor.

Reserve um espaço na casa para colar os trabalhos dele, e guarde os antigos em um catálogo, para dar espaço a novos desenhos.

Encoraje seu filho a falar dos desenhos que ele fez. Assim você aprenderá sobre o momento que ele está vivendo, e sobre seus sentimentos. Evite criar uma dependência de sua presença ou de suas sugestões nesse momento.

Fonte: Livro Como desenvolver a inteligência do seu filho, Ed. Seleções Reader‘s Digest

Desenhar ajuda nos estudos

Adicione a efervescência dos adolescentes a uma aula impregnada de informações de tempos remotos. O resultado? Alunos dispersos na aula de História. Mas basta assistir a uma aula do professor Márcio Vaccari, 35, para viajar no traço e conseguir imaginar como era a vida em outros tempos. É assim que ele prende a atenção de seus alunos, colocando seu hobby no quadro enquanto conta os detalhes da era medievais. “O desenho é um estímulo para eles apreenderem na mente as imagens originais da História.

Se isso atrai a atenção dos alunos, melhor ainda. Para mim, é apenas um estimulante para direcioná-los ao livro”, diz Márcio, um cara simples, que não assina nem os desenhos que faz para os amigos. “A arte é coletiva, é livre. Uso para me expressar”, simplifica. E ele tem talento. É impressionante, começa a desenhar de trás para a frente. “Culpa” da irmã, artista plástica. “Desenho desde criança, porque ela sempre deixou o material acessível, nunca me proibiu de usar”, ri.

Há dois anos, resolveu pintar, fora do papel. Não faz arte concreta, nem abstrata. Mas põe cor em cenas da literatura. Gosta mesmo é de desenhar gente. “Quando estou parado, distraído ou até no telefone, desenho gente em movimento. Contraditório, não?”

Desenhar ajuda a ganhar (ou perder) uma vaga

Uma gama de profissões exigem um bom traço para engrenar. Mas, antes de conseguir um emprego, ou mesmo passar numa prova teórica de trânsito, muita gente pode ser mal interpretado por um desenho. Nos testes de seleção mais modernos, os desenhos nem são tão usados mais, porém, podem revelar como você se projeta no mundo.

Ou seja, se desenhar uma pessoa sem chão, pode estar transmitindo ao avaliador que você não está firme em seu território, ou não sabe muito bem o que quer. O Google tem mais um monte desses macetes, que revelam alguns truques para ser aprovado na seleção. “Por isso mesmo, muitas empresas de seleção pararam de usá-lo, embora isso não altere muito o desenho da pessoa, pois na hora da prova, a coisa muda”, ri a analista de RH da Selecta, Sueli Martins.

De acordo com ela, um traço muito fora do comum pode mesmo atrapalhar a aprovação para a vaga tão sonhada. “É uma avaliação muito subjetiva, por isso é mais usada em clínica. Mesmo assim, ele pode desclassificar alguém, sim. Pode parecer confuso, mas para quem avalia é bem claro”

Desenhar espanta fobias

Sem compromisso estético ou formal, também é possível desenhar e se livrar de fobias e outros problemas emocionais tão cinzas quanto esse. Isso, graças à arteterapia, um tratamento que ultimamente anda sendo bastante reconhecido por médicos - em breve deve até entrar na grade de um curso de medicina do Estado.

Parece uma boa desculpa para um hobby, mas está bem longe de ser. “A arteterapia trabalha com a livre expressão, o que proporciona transformação e autocura porque dá vazão ao seu conteúdo, à criatividade”, diz Glícia Manso, arteterapeuta e presidente da Associação de Arterapia do Espírito Santo. E acrescenta: “Essa terapia cura no sentido de tomar posse do que você é, minimizando as dificuldades e conhecendo-as, realmente”, acrescenta. É como se fosse uma outra linguagem das emoções.

O terapeuta orienta a trabalhar bastante com as mãos, com o corpo e com a música. “É preciso ofertar várias linguagens da arte para o paciente se identificar”, diz Glícia. Geralmente, a terapia tem até duas sessões por semana, de uma hora cada. Os resultados, inclusive, são muito bons. “Às vezes, a pessoa consegue expressar algo na arte que verbalmente não conseguiria”, ensina ela. Depois da arte pronta, o arteterapeuta chega a conclusões com o paciente. “Temos medo de sermos criticados ao libertar traços no papel. Por isso, o desenho não pode ter nenhum efeito estético”, observa Glícia.

Tudo tem conteúdo simbólico, e é preciso colocar para fora. Se for difícil, a música pode ajudar. A maioria das artes que os pacientes preferem é o desenho no papel. “Essa atividade é estruturadora. Já o barro é mais intimista, e quando o paciente tem medo da argila, oferecemos o lápis, que dá muita segurança.”


Desenhar melhora a concentração

E lá está você, numa reunião, em frente à equipe toda, riscando o caderno, de onde saem super heróis, casinhas, flores e tudo mais que a sua imaginação mandar. Ou então acontece durante uma conversa longa ao telefone: uma enxurrada criativa toma conta do lápis no papel, e você solta uma porção de estrelinhas, coraçõezinhos, carinhas de coelho...

A psicóloga Monalisa Dibo, que pesquisa o assunto há alguns anos, garante que maioria das pessoas faz círculos em espirais. Ou então setinhas. No primeiro caso, uma das interpretações dá conta de uma tentativa de encontrar a si mesmo. Já as setas indicariam a busca de caminhos, alternativas.

E aquelas pessoas que rabiscam interrogações? Segundo a especialista podem estar querendo as respostas para suas dúvidas, enquanto aquelas que desenham casinhas buscam proteção. “Claro que nem tudo pode ser levado tão ao pé da letra, pois depende do momento que cada um está vivendo, do dia, e de uma série de coisas”, avalia ela. Mas que existe essa relação, ela não tem dúvida.

E para quem critica o desenho alheio na reunião de trabalho, justificando que seja falta de atenção, os cientistas dão um recado: pode ser exatamente o contrário. Jackie Andrade, em seu livro What does doodling do? (2009, sem tradução para português ainda), diz que esboçar um desenho por aparente distração ou de alheamento, não é uma perda de tempo. “É uma estratégia para ajudar a manter a atenção. Na verdade, parece ser a forma que algumas pessoas desenvolveram para contrariar o efeito de uma atividade monótona, ou, para se focarem de forma intensa em algo”.

E se o desenho for uma mandala, melhor. A psicóloga Monalisa Dibo comprovou cientificamente que mandalas favorecem ainda mais a concentração. Dividindo adolescentes em duas turmas, pediu a uma delas que desenhasse uma mandala por 40 minutos, e a outra, simplesmente, que ficasse sem desenhar. No fim da atividade, ela sentiu nitidamente: a turma que desenhou mandala teve uma melhora impressionante de concentração. “A aula deles rendeu mais, eles captaram melhor as informações e aprenderam muito mais“, explicou a psicóloga, acrescentando que a própria turma percebeu que estava mais concentrada. Ela não decidiu estudar o assunto por acaso.

Na Alemanha, os estudantes repetem essa atividade antes das aulas há muitos anos. “Das crianças menores às mais velhas, todas mantêm seus cadernos de desenho. Com isso, têm mais atenção nos estudos, tanto na sala de aula como ou em casa”

Desenhar solta os monstros e amarra as ideias

Desenhos são janelas que permitem ver como anda o interior de cada um. “Conseguimos ver a subjetividade e até perceber se há conflitos ali”, observa a psicóloga junguiana Mariana Taliba Chalfon.

Mas é importante dizer que um desenho é uma ferramenta, não uma análise isolada. Por isso, não vale sair por aí avaliando mal crianças que desenham monstros, por exemplo. Aliás, se monstros saírem delas e forem para o papel, ótimo. “À medida que criamos uma imagem, ela expressa um conflito que fica mais fácil de ser visualizado. Mesmo que não se estabeleça um diálogo racional entre a pessoa e a imagem, há uma catarse, um sentimento fica concretizado”, explica Mariana, mestranda em Psicologia Clínica.

Isso fica ainda mais claro quando os sentimentos estão indefinidos dentro da gente. Por isso, corra para pegar lápis e papel: você pode dissolver ali mesmo emoções como a angústia. “É como se você desse forma a um sentimento”, avalia Mariana.

Para as crianças, por exemplo, um desenho pode transmitir informações interessantes sobre o momento que ela vive, seu temperamento, suas carências e suas paixões. O livro “Como interpretar os desenhos das crianças”, da pedagoga Nicole Bedard, ajuda a compreender melhor o tema. Entre as considerações da pedagoga, estão a relação entre as idades e suas representações no papel: “Entre 2 e 3 anos de idade, a criança ainda não faz desenhos com significado representativo. Já entre os 3 e 5 anos de idade, ela já tenta desenhar de acordo com a sua realidade, e para elas, as imagens tem todo um sentido.

Mande a tristeza embora

Bom humor é indispensável para Vanessa Priscilla Amorim de Carvalho, 23, exprimir no papel suas emoções. No entanto, ironicamente, é nas crises existenciais que saem os melhores desenhos. Curvas sinuosas preenchem, com detalhes as folhas em branco, e assim esgotam horas tristes ou angustiadas.

É uma terapia que acabou virando profissão também. O traço levou tempo para alcançar a maturidade, diz Vanessa. “Aos 10 ou 12 anos comecei a rabiscar. Aos 14, comecei a observar mais a anatomia do corpo humano, e comecei a desenhar com grafite 6B”, conta, íntima dos materiais que mais gosta. “Comecei como um ócio criativo mesmo. Mas já passei até oito horas em cima de um papel. Parece um transe, quando começo a desenhar. Só paro se tiver algum compromisso, mas esqueço de comer, de ir ao banheiro, esqueço do mundo”. Segredo para começar a se arriscar sem medo no caderno de desenhos? Observar bem. “No início, não desenhava mão, e nem pé. Mas passei a olhar muitas fotos e assim, consegui“

Fontes: Glícia Manso arterapeuta e presidente da Associação de Arterapia do Espírito Santo. Monalisa Dibo psicóloga. Sueli Martins psicóloga analista de RH da Selecta. www.desenhosparacolorir.org Caderno de Rabiscos para Adultos Entediados no Trabalho. Claire Fay, editora Intrinseca, 2008. (R$ 11,00, em média).